O POEMA QUE MAIAKOVSKI NÃO ESCREVEU

Um poeta brasileiro tem sido confundido, com frequência, nas quatro últimas décadas, com o poeta russo Vladimir Maiakovski. Os equívocos cometidos, as leituras apressadas, uma provável desatenção e, até mesmo, certo descaso com a produção poética brasileira contemporânea, já produziram interpretações impensadas e informações à beira de um ataque de sandice no meio cultural brasileiro. Comentários e artigos de algumas personalidades, de gente ilustrada e lida, têm reanimado a confusão e perpetuado um erro, no mínimo, culpado por uma séria injustiça que desvaloriza um dos grandes nomes da poesia brasielira particularmente criada na segunda metade do século 20. O poeta em questão é o fluminense Eduardo Alves da Costa, nascido em Niterói (RJ) e, paulistanizado desde os anos 60, reconhecidamente um dos mais expressivos poetas de São Paulo, cidade cuja produção poética é rica também por contar, em sua geração, com nomes da grandeza de um Álvaro Alves de Faria, Alberto Beuttenmuller, Eunice Arruda, Renata Pallottini, Cláudio Willer, Jaa Torrano, Érico Max Muller, Roberto Piva, entre outros. Confundem o seu nome com o de Maiakovski por causa da publicação do seu poema, justamente intitulado "No caminho, com Maiakovski", incluído originalmente no seu livro O TOCADOR DE ATABAQUE, lançado em São Paulo no ano de 1969.
A Editora Nova Fronteira, do Rio de Janeiro, ao publicar a poesia reunida de Eduardo Alves da Costa, em 1985, com o título geral NO CAMINHO, COM MAIAKOVSKI, transcreveu os versos iniciais (que é a única parte conhecida do poema) com esta nota explicativa :
"A autoria deste poema tem sido atribuída, por equívoco, ao poeta russo Vladimir Maiakovski. O poema foi escrito por Eduardo Alves da Costa, em 1964."
Mas, assim mesmo, os equívocos continuaram e continuam por este Brasil desmemoriado afora. Só para exemplificar, de forma bem localizada, cito alguns equívocos cometidos por escritores e jornalistas pernambucanos que conheço.

Há alguns anos, um professor, jornalista e poeta muito bem conceituado e reconhecidamente um erudito, publicou, no Diário de Pernambuco, excelente artigo com a sua revelada e justa indignação sobre o momento político nacional, citando o poema de autoria de... Maiakovski ! Por conhecê-lo e respeitá-lo, quando o encontrei, dias depois, lhe dei a informação sobre o verdadeiro autor do poema e ele, muito educado e consciencioso, me agradeceu a providencial correção. E outro não menos informado e culto jornalista, com coluna no Diário de Pernambuco, escreveu, em 2004, texto crítico muito bem contextualizado sobre a nossa indigente política nacional, citando "as flores do jardim" do poema de autoria de ... Brecht ! (Tem também este alemão na história) Por conhecer pessoalmente o jornalista, enviei comunicação sobre o erro acidental e ele me agradeceu com informação imediata divulgada na sua prestiada coluna. Mas a confusão das identidades dos poetas continuou ainda neste ano de 2007, com a publicação de um artigo corajoso, vigoroso e muito bem escrito, defendendo o Nordeste brasileiro, de autoria de conhecido professor e escritor pernambucano, em um dos jornais diários do Recife, em que Maiakovski, mais uma vez, é enaltecido como autor do poema no qual ele é citado e o autor é o brasileiríssimo Eduardo Alves da Costa.

Nos outros Estados brasileiros os exemplos desse tipo devem se multiplicar... e a clássica história de "quem conta um conto acrescenta um ponto" vai se transformando em algo parecido com "o poeta que é citado num poema acaba se tornando o seu autor".
É preciso que se reconheça a importância de Eduardo Alves da Costa como um dos grandes nomes da poesia brasileira do Século 20. E isso não apenas por ombrear-se ao gigante russo Maiakovski, caminhando ao seu lado e lhe ditando, com o sangue dos seus versos candentes, a alma mestiça da América brasileira pulsando ritmada o seu discursivo e belo poema citado, e, sim, também, pela notável criação plena de verdade e consciência crítica dos seus poemas, a exemplo de "O tocador de atabaque", "A rosa de asfalto", "A cama de pregos", "Ouço ruído de tambores", "Tentativa para salvar a poesia", "Canção para o meu tempo", Sugestões para elaboração de um novo mural na ONU", "Banana split", "Tropas", "Nova presença no mundo" e "Na terra dos brucutus", entre outros, todos (imperdíveis e leitura obrigatória para quem se sente brasileiro e latino-americano) publicados no seu livro NO CAMINHO COM MAIAKOVSKI.

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Transcrito da Revista CONTINENTE
(CEPE, Recife, janeiro/2008).

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