RETRATOS FALHADOS, de Dalila Teles Veras

AS FAXINEIRAS DO EDIFÍCIO

surpreendentemente
(não obstante os dez mil, quatrocentos e trinta e um degraus, os oito mil, trezentos e vinte metros quadrados de piso, as quatrocentas e quinze vidraças e as três toneladas de lixo à espera de varrição, transporte e limpeza)
cantam...

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ESPELHO PROVISÓRIO

"São os espelhos que me revelam :
Sem eles talvez eu não soubesse de mim"
(CECÍLIA MEIRELES)


Minha imagem nas vitrinas da cidade
(estrangeira, sempre )
ausculto :
os becos que dormitam
os cruzamentos infernais
os silêncios súbitos
a luta surda
a grita explícita
por um lugar à fresca
por um sonho de ribalta
pelo simples sobreviver

Anoto :
o que não está à frente
o que não brilha
o que não grita
o que não é outdoor
a camada abaixo da camada
o que não é mais
o que passa a ser
palimpseto revelador

Serei eu essa imagem trêmula
nativa entre estrangeiros ?
Será minha esta opaca imagem
que o lago turvo da falsa Praça
não permite distinguir ?


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RITO DE PASSAGEM


Que sabemos nós
seres chorosos
à beira da morte
do outro ?

Que sabemos nós
seres medrosos
à beira da vida
à beira de nós mesmos ?

Que sabemos nós
da barca à espera
da passagem
do mistério ?

- Nada

Por isso tememos


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Poemas do livro RETRATOS FALHADOS,
de Dalila Teles Veras
(Escrituras Editora, São Paulo, 2008),
a ser lançado, dia 4 / agosto / 2009,
no Gabinete Português de Leitura de Pernambuco,
às 17 horas, no Recife (bairro de Santo Antônio).


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