RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM, de José Saramago

Há na memória um rio onde navegam
Os barcos da infância, em arcadas
De ramos inquietos que despregam
Sobre as águas as folhas recurvadas.


Há um bater de remos compassado
No silêncio da lisa madrugada,
Ondas brancas se afastam para o lado
Com o rumor da seda amarrotada.


Há um nascer de sol no sítio exacto,
À hora que mais conta duma vida,
Um acordar dos olhos e do tacto,
Um ansiar de sede inextinguida.


Há um retrato de água e de quebranto
Que no fundo rompeu desta memória,
E tudo quanto é rio abre no canto
Que conta do retrato a velha história.



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"Homenageando o grande escritor português
que partiu recentemente, envio um poema dele,
que talvez surpreenda a quem não conheceu
a sua poesia." (MARIA DE LOURDES HORTAS /
E-mail datado de 22/junho/2010).

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