Nada será jogado no vazio.
Nem mesmo o vazio da vida,
porque é vida.
Nem mesmo o gesto inútil,
pois-que é gesto.
Nem mesmo o que não chegou a realizar-se,
pois-que é possível.
Nem mesmo ainda o que jamais se realizará,
porque é promessa.
E o próprio impossível
é vontade absurda de existir.
E nisso existe.
...........................
Recife, primeira de todas as cidades
e a última de todas, a mais persistente
nas lembranças, a que mais teima
em não ser esquecida.
Recife, sofrida e linda,
generosa e rebelde,
que amas o mar que te agride
e te beija nas pedras arrecifes,
Recife que te banhas
desacanhada e nua
nas águas de teus rios
por baixo de tuas pontes
e te retorces nas estreitas ruas
de teus bairros antigos,
de assombrados sobrados
e dormes serenamente nas areias das praias
sonhando o teu futuro
que o passado de lutas te promete.
Oh! como é doce nascer em ti
mas como custa viver em ti
cidade contraditória e múltipla, cidade
que misturas batalhas e folguedos,
que enquanto te rebelas,
bailarida e guerreira
danças o frevo nas ruas e os maracatus.
Moro em ti
e tu demoras em mim, Recife !
..............................
Minha mãe era anoitecida.
Às vezes orvalho, às vezes estrela.
De repente, ria. De repente, chorava.
Falava sozinha enquanto trabalhava.
Resmungos, ou não sei se filosofia.
Descascava batatas, partia cebolas
e sonhava
"Para não perder tempo",dizia.
Com que seria que minha mãe sonhava ?
.......................................
O POETA E A PALAVRA
(fragmento)
..................
O poeta tortura-se.
A palavra é seu meio
é seu modo
é seu mundo.
É a matéria e a forma
de sua arte,
é a sua mãe, sua filha,
a palavra é seu rosto,
é o motivo maior de seu desejo.
A exata palavra
sugere mas não diz,
não dirá nunca.
A palavra se recolhe em teu silêncio.
E se a encontrares, despreza-a.
Seria verdadeira talvez
e assim destruiria
o teu possível poema.
Navega sempre os mares das palavras
mas sabe-as sempre incertas, imprecisas,
bem longe da palavra que procuras.
A exata palavra.
Não há palavra exata no poema.
Há beleza.
E a beleza é inexata e equívoca.
___________________________________
Do livro POEMAS, de Daniel Lima
- Companhia Editora de Pernambuco-CEPE /
Secretaria da Casa Civil/Governo de Pernambuco,
Recife, PE, 2011.
Nem mesmo o vazio da vida,
porque é vida.
Nem mesmo o gesto inútil,
pois-que é gesto.
Nem mesmo o que não chegou a realizar-se,
pois-que é possível.
Nem mesmo ainda o que jamais se realizará,
porque é promessa.
E o próprio impossível
é vontade absurda de existir.
E nisso existe.
...........................
Recife, primeira de todas as cidades
e a última de todas, a mais persistente
nas lembranças, a que mais teima
em não ser esquecida.
Recife, sofrida e linda,
generosa e rebelde,
que amas o mar que te agride
e te beija nas pedras arrecifes,
Recife que te banhas
desacanhada e nua
nas águas de teus rios
por baixo de tuas pontes
e te retorces nas estreitas ruas
de teus bairros antigos,
de assombrados sobrados
e dormes serenamente nas areias das praias
sonhando o teu futuro
que o passado de lutas te promete.
Oh! como é doce nascer em ti
mas como custa viver em ti
cidade contraditória e múltipla, cidade
que misturas batalhas e folguedos,
que enquanto te rebelas,
bailarida e guerreira
danças o frevo nas ruas e os maracatus.
Moro em ti
e tu demoras em mim, Recife !
..............................
Minha mãe era anoitecida.
Às vezes orvalho, às vezes estrela.
De repente, ria. De repente, chorava.
Falava sozinha enquanto trabalhava.
Resmungos, ou não sei se filosofia.
Descascava batatas, partia cebolas
e sonhava
"Para não perder tempo",dizia.
Com que seria que minha mãe sonhava ?
.......................................
O POETA E A PALAVRA
(fragmento)
..................
O poeta tortura-se.
A palavra é seu meio
é seu modo
é seu mundo.
É a matéria e a forma
de sua arte,
é a sua mãe, sua filha,
a palavra é seu rosto,
é o motivo maior de seu desejo.
A exata palavra
sugere mas não diz,
não dirá nunca.
A palavra se recolhe em teu silêncio.
E se a encontrares, despreza-a.
Seria verdadeira talvez
e assim destruiria
o teu possível poema.
Navega sempre os mares das palavras
mas sabe-as sempre incertas, imprecisas,
bem longe da palavra que procuras.
A exata palavra.
Não há palavra exata no poema.
Há beleza.
E a beleza é inexata e equívoca.
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Do livro POEMAS, de Daniel Lima
- Companhia Editora de Pernambuco-CEPE /
Secretaria da Casa Civil/Governo de Pernambuco,
Recife, PE, 2011.
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