São Paulo, capital : década de 1970
(Estadão Conteúdo - 21.03.1978)
Giovanna Giordano
(Altavilla Irpina, Itália)
"Porém, se houver sol,
e as ruas tiverem sabor de vento
e de mar,
e se os muros das casas
forem brancos, muito brancos,
eu sairei, com os outros.
Porém se houver cantos,
cantos de amor,
de amor enorme
- e não tão somente de dois,
e sempre de dois -
eu cantarei, com os outros."
(PORÉM SE HOUVER SOL, fragmento)
Ramão Gomes Portão
(Corumbá, MT)
"Há momentos
que não temos
para onde fugir.
Tempo morto.
Alma marmórea.
Gesto solto.
Do pranto do povo nascem lágrimas
e angústia
da sua fome.
Há clamores que vivem nas ruas,
nos becos escuros,
nas ruas sem pedras
sem luz
as casas pobres..."
(NAS RUAS ESQUECIDAS, fragmento)
Ilka Brunhilde Laurito
(São Paulo, SP)
"Tenho poema
de toda medida e peso
e para toda idade.
Só não tenho
pro meu irmão analfabeto
que vê meu cartaz na praça
e pergunta em voz baixa :
- isto aqui é um ginásio ?...
Não, irmão,
nem escola primária.
É uma feira de palavras
em que olhando pra você
o meu pregão
se cala."
(LITERATURA DE CORDEL)
Oliveira Ribeiro Neto
(São Paulo, SP)
"Hoje que estás rica, de pedra vestida,
toda rendilhada qual noiva garrida
do São Paulo novo dos arranha-céus,
hoje que não dormes sob os longos véus
de névoa e de garoa do São Paulo antigo
de ruas estreitas e falar pausado,
eu confio e espero em tua mocidade
que é a mesma sempre, minha Faculdade,
pois Rui e Nabuco e Rio Branco, e mil outros
que deram à pátria seu nome glorioso
enchendo de luzes páginas da história,
vão mostrando aos moços, por felicidade,
que o teu nome sempre, minha Faculdade,
é a melhor das rimas para liberdade,
é a melhor das chamas para o altar da glória !"
(CANTO DE GLÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO
DE SÃO PAULO, fragmento)
Renata Pallottini
(São Paulo, SP)
"Mas tudo falha e eis que um vagabundo
espera a morte no campo branco do seu leito.
Ao redor a vastíssima cidade sufocada,
acuada, agachada ante a morte vacila.
No leito o vagabundo espera a morte estático.
No campo da cidade espreitamos a morte,
espreitamos o Deus, o fim, o significado,
a árvore negra, a forma, o marco, esperamos o dia
na longa noite em que esperamos a morte."
(ALGUMAS FANTASIAS SOBRE A MORTE, fragmento)
Cassiano Ricardo
(São José dos Campos, SP)
"Salpicado de sol. Sol
picado.
Sei que queima, a ouro,
o pêlo dos bichos
pelos vãos das árvores
em seu tigradouro.
Um tigre na cidade
um cromo forte.
Uma mudança brusca
em cada palavra
dentro do dicionário
onde resido.
A beleza do tigre
na cidade.
Um indício, talvez,
de poesia como coisa
selvagem."
(SALTO NO ASFALTO, fragmento)
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Textos transcritos da antologia paulistana
POETAS DA CIDADE - SÃO PAULO, 2 /
Organização de Renzo Mazzone
(Editora I.L.A. Palma -
Palermo, Itália / São Paulo, Brasil, 1970)
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